Que bela e forte história a de Eufrosina Maria de Jesus, ou carinhosamente, D. Tula. Nascida em 15 de outubro de 1948, em Condeúba, Bahia, ela chegou ao mundo em uma data que, de fato, parecia prenunciar a força e a lição de vida que viria a ser. Sua beleza, descrita como natural e absurdamente encantadora, era apenas um reflexo de sua alma resiliente.
Ainda adolescente, Eufrosina fez as malas e partiu para São Paulo em busca de melhores condições. Hospedada inicialmente na casa de Julita, deu-se início à sua grande jornada na cidade que a acolheu com a promessa de trabalho.


Aos 12 anos, em 1962, pisou pela primeira vez nos corredores da Escola Arnaldo Barreto, no Tremembé, zona norte da cidade, buscando o saber que seria uma ferramenta essencial em sua vida. Pouco depois, em 1964, aos 16 anos, começou a trabalhar na casa de uma família de médicos na Rua Cardeal Arcoverde. Foram cinco anos repletos de aprendizado e momentos felizes.

Foi nesse período, em 1965, que ganhou o apelido que a acompanharia pela vida: D. Tula, inspirado na personagem de Nívea Maria na novela “O Preço de uma Vida”, exibida pela extinta TV Tupi.

Durante essa fase de descobertas, teve a oportunidade de conhecer o mar e o Shopping Iguatemi, expandindo seus horizontes para além do cotidiano.


Seu lazer de domingo era simples, mas revigorante: frequentar o Parque do Horto Florestal, buscando a tranquilidade da natureza. De vez em quando, ia até a imponente Catedral da Sé, no coração da cidade, talvez em busca de refúgio espiritual.

Eufrosina sempre erguia os olhos com admiração para o alto da Serra da Cantareira, acalentando o desejo de avistar a vastidão de São Paulo lá de cima. Houve um tempo, talvez ligado a uma viagem de trem mencionada, em que essa possibilidade pareceu próxima. Infelizmente, esse sonho jamais pôde ser plenamente realizado.

Em 2010, quando uma caminhada coletiva foi inaugurada no parque, talvez oferecendo a oportunidade que ela tanto almejava, suas pernas já não lhe obedeciam como antes. A subida ou mesmo o acesso ao mirante tornaram-se obstáculos intransponíveis para seu corpo fragilizado.
Assim, o desejo de contemplar a cidade do alto da serra permaneceu como uma lembrança poética. A história de Eufrosina se tornou a delicada narrativa de uma mulher que sonhava alto, mas que, ao fim, encontrou as limitações em seu próprio corpo.

Em 1969, selou sua união na Igreja São Pedro Apóstolo, no Tremembé, dando um novo passo em sua jornada. A vida de casada, no entanto, estava apenas começando e logo apresentaria desafios.
A década de 1970 trouxe consigo a difícil, mas fundamental, tarefa de criar três filhos. Em uma época de estradas de terra e poucas linhas de ônibus, D. Tula viveu integralmente para a família. Longe das facilidades urbanas, dedicava-se com esmero ao lar. Apesar de ter cursado apenas o ensino fundamental, possuía uma capacidade de raciocínio lógico notável e era de uma correção impecável em tudo o que fazia. Sua casa, reflexo de seu cuidado, era sempre impecavelmente limpa e organizada.
Após a separação, a vida impôs novas dores e sofrimentos. Essa fase difícil fez com que D. Tula abandonasse a pouca vaidade que tinha, mergulhada em tristeza e amargura. No entanto, essa dor profunda nunca conseguiu suplantar a vastidão de sua generosidade. Sua força interior, mesmo abalada, emanava em atos de bondade para com os outros.

Nos momentos de respiro, suas distrações eram simples e queridas: a companhia de Paulo Barbosa e Zé Bettio no rádio e as tardes de domingo com Silvio Santos na TV. Quantas vezes o rádio, companheiro fiel durante a lavagem de roupa feita à mão, posicionado na janela, escapou de suas mãos e caiu na água, trazendo um leve riso em meio à labuta. Embora a vida tenha sido marcada por dores e traições, o que realmente define Eufrosina é sua inabalável força.
Ela criou três filhos que, hoje, são exemplos de homens e mulheres de bem, carregando consigo os valores ensinados pela mãe. A maior alegria em seus últimos anos foi ver a família crescer com a chegada dos três netos, frutos do amor e da dedicação que ela semeou.
Eufrosina Maria de Jesus, a D. Tula, partiu em 09 de julho de 2014, vítima de um câncer no pâncreas. Deixou para aqueles que a amavam um legado imensurável de perseverança, resiliência e, acima de tudo, nos ensinou, com sua própria vida, o verdadeiro significado do amor e da dedicação à família. Sua história é um testamento silencioso da força que reside em uma mulher que, apesar das adversidades e dos sonhos não realizados, viveu com dignidade e deixou marcas profundas de carinho e ensinamento.


PS: Eu, Eliane, filha caçula, fui na caminhada noturna e me senti muito emocionada ao imaginar o que minha mãe poderia estar sentindo naquele momento.
